quinta-feira, 27 de novembro de 2008

O Quintal Como Categoria Sociológica

Roberto DaMatta, nesse livro, invencionou a idéia de Rua e Casa como categorias sociológicas fundamentais para a compreensão da sociedade brasileira. Barrocos, nos entendemos através de antíteses: público e privado, fora e dentro, masculino e feminino. O autor se refere ao quintal como “o espaço arruado da casa”. Fiquei pensando...o que há de "arruado" no quintal? Céu aberto, chão de terra, árvore, bicho, chuva, vento, sereno...Uma certa aventura (projetada), algum risco (calculado), uma interação com o tempo e o espaço.
Cá pra mim, tenho que o quintal também é uma categoria sociológica fundamental para o entendimento da infância. Quintal não designa apenas um espaço geográfico. As categorias sociológicas são (vou citar o cara por completa incapacidade de dizer melhor e mais bonito) “acima de tudo, entidades morais, esfera de ações sociais, províncias éticas dotadas de positividade, domínios culturais institucionalizados e, por causa disso, capazes de despertar emoções, reações, leis, orações, músicas (blogs) e imagens esteticamente emolduradas e inspiradas.” Pura poesia em forma de texto dissertativo, não é?!
_Cibbele Carvalho_

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

SURPRESA!







Menino precisa ser surpreendido. Sem surpresa, no party. A gente devia - bem que podia - manter essa característica pra vida toda. Porque surpresa é mais ou menos a máxima moriniana de ESPERAR O INESPERADO. Menino faz isso muito bem. A gente não. A gente é cheia de expectativas, mas se recusa a esperar o inesperado. Ao contrário, a gente quer sempre prever, e aí tudo vai perdendo a graça. Envelhecer é isso (também?).
Quando a gente convive com crianças - especialmente se são crianças saudáveis e muito muito vivas - aprende que uma pequena - aqui na Itália inclusive mínima - dose de surpresa muda tudo. Quiçá os educadores soubessem esse segredinho e o usassem com mais constância... e/ou com mais sabedoria. Porque não basta surpreender por surpreender. A surpresa tem de ser surpreendentemente ... surpresa!

Alguns exemplos:
  • um espetáculo de teatro de marionetes francês que assisti outro dia em Mantova. Falando assim, ESPERA-SE que as marionetes sejam pequenininhas, que a cena se passe num palco e que os atores manipulem os bonecos do alto. Na-na-ni-na-não... eles fazem. E vem com uns bonecoes imensos, balões flutuantes, manipulados de baixo (ok, com fios) por três ou quatro pessoas. O cenário? O céu da cidade. Mais surpreendente ainda é que a história se passa no fundo do mar. Ou seja, nós público, somos colocados no fundo do fundo, na medida em que assistimos tudo "de baixo". Enfim, um deslocamento de ponto de vista extraordinário. Os manipuladores interagem com o público de um modo muito interessante, fazem parte do boneco, caminham do nosso lado como se fossem eles também personagens, provocam emoções extras com gritos, expressões, um deles chegou a "cutucar" uma menininha na platéia. Resultado: como não podia deixar de ser, crianças absolutamente satisfeitas (surpreendidas), adultos encantados, famílias devidamente "alimentadas" num domingo cultural.

  • os - bons! - narradores/contadores de história. No Museu onde eu trabalho, a moça que faz a visita guiada tem esse dom de sobra. E assim ela consegue apresentar um cavalinho de pau ou um "pracinoscópio" (precursor do cinema) de 300 anos a uma menininada acostumada com computador e DVD sem que ninguém pisque! A-do-ro ouvir os "oohhhs" enquanto ela desfila seu novelo de brinquedos artesanais, "anacrônicos", mais-que-simples...

  • Os mágicos de espetáculo. Às vezes, eu queria ser como eles pra brincar com as crianças. Queria conhecer e realizar com tamanha habilidade algumas ações simples, do tipo que enganam os olhos e surpreendem. Surpreendem sem que sejam magia de verdade - todo mundo sabe disso, inclusive as crianças, mas nem por isso deixam de ser magia. Magia de mentirinha - eu queria conhecer essa Arte, juro.

Fotos minhas do Espetáculo "A Pérola" , do grupo frances Plasticiens Volants, apresentado durante o Festival Internazionale d'Arte e Teatro per l'Infanzia em Mantova, Itália, 9 de novembro de 2008.

_Claudia Souza _

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

O dia em que os Backyardigans Aniquilaram Fedidópolis


Quando vi que o episódio de hoje ia se passar em Fedidópolis, parei tudo na esperança de ver o desenho caminhando para sua redenção, ainda que já na terceira temporada. Fiquei frustradíssima! Todos estavam contra Austin, o Príncipe das Calças Sujas. No fim, Tasha, Pablo, Tairone e Uniqua conseguem encurralar o príncipe e banhá-lo numa fonte. Como se não bastasse, o subversivo Austin trai a sua verdadeira vocação quintarolesca e se junta aos quatro reacionários para cantarem o ensaiadinho hino cívico_ Ode ao Sabonete! Francamente! Não sei onde esse mundo vai parar!


_Cibbele Carvalho_

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Nova versão do velho

Não sei quando exatamente isso se deu, só sei que a partir de hoje estou rodando com a versão beta do in mode 31. As diferenças da versão .30 para a nova versão só poderão ser averiguadas após alguns acessos. Ainda não há notícias de incompatibilidades, já que o .31 possui um dispositivo mais eficaz de rescue.
Em outras palavras, estou ficando mais velha!

_ Cibbele Carvalho_

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

O Estranho Quintal-Palco dos Backyardigans

Estréia hoje, no Discovery Kids, a terceira temporada de Backyardigans. A maior surpresa dos novos episódios será o surgimento de um novo personagem, o dinossauro Boy. Confesso que o desenho me causa um estranhamento-quase-constrangimento, que me levou a demorar alguns episódios tentando decifrar.

Estranhei, inicialmente, o quintal artificial, ensaiado, sem espontaneidade, asséptico e livre das marcas produtivas do quintal brasileiro a que me referi: varal, pomar, horta, bichos, adultos trabalhando. O quintal do desenho canadense é campo de ação unicamente infantil, pra não dizer, infantilizado, com fronteiras bem demarcadas entre o adulto e a criança. No máximo, vemos ali, uma árvore ornamental e um tanque de areia. É um quintal, plano, capinado, adaptado, limpo e por isso mesmo, livre dos desrelevos que nos impelem a escalar e ver além.

Não há muros e por isso, não há intimidade. Os Backyardigans não só sabem que podem estar sendo observados, como dirigem-se ao telespectador e aqui o meu constrangimento se torna ainda maior.

Sabemos que a criança pequena não faz teatro, mas joga dramaticamente, uma vez que ela não fantasia para entreter uma platéia. Minha filha, quando é surpreendida sendo observada por mim em suas brincadeiras de faz-de-conta, costuma repreender: “_Não gosto que me vejam brincando!” E é por isso que a falta de muros do quintal-palco bakyardiganiano me soa como uma bela música tocada num teclado e seus amplificadores.

Isso nos faz perceber que o quintal não é um espaço físico nos fundos de uma casa com crianças, mas um jeito de ser-explorante-continuamente. E digo dessa forma, porque morei toda a minha infância num apartamento pequeno e apesar disso, carrego comigo uma quintarola.

Mesmo assim, principalmente se comparado a outros desenhos, o Backyardigans não chega a ser prejudicial e demonstra grande avanço nos produtos mercantilizados que temos oferecido às crianças. Aqui em casa, certamente, vamos querer ver quem é esse tal Dino-Boy, mas não sem achar esses bichinhos exibicionistas no mínimo, muito esquisitos.
_Cibbele Carvalho_

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

O Quintal Como Espaço de Auto-Projetação

Quem observa uma criança brincando livremente no quintal percebe como ela vai construindo um sem-fim de significados em cada ação. Um pedacinho de pau vai sendo transformado continuamente. De espada a corpinho de boneca, de talher a pincel, de cavalinho a, de novo, espada. E essa operação vai se complexificando cada vez mais, na medida em que o pedacinho de pau vai sendo combinado e re-combinado com outros elementos também simples, como pedrinhas, plantas, água. Não precisa de muita quantidade, nem de varieadade pra dar sentido na brincadeira. As necessidades são poucas e genuínas. Os objetos ocupam um importante lugar de representação, como deveriam ser normalmente se não tivessem sido, um dia, transformados em produto. E a criança reina absoluta nessa teia, projetada por si mesma, pelo seu Desejo.
Na medida em que projeta, ela se auto-projeta, se constrói como Sujeito, para-além de uma tênue identidade. O Sujeito auto-projetado é dono de si mesmo, não esta à merce de nada nem de ninguém. Não sofre homologações – ao menos ali, naquele momento em que é levado pela brincadeira. Pode criar a seu bel-prazer um mundo encantador e aberto.
Auto-projetar-se significa construir um significado para si mesmo no mundo.
Quantos de nós adultos – cercados de toda sorte de objetos e de sofisticações - somos capazes dessa proeza?

_Claudia Souza _


EDIÇÃO EXTRAORDINÁRIA:
Plebiscito em BH

Quinteiros eleitores em Belo Horizonte, vamos votar até o dia 05 de dezembro no plebiscito on-line para escolher o projeto a ser implementado no Mercado de Santa Tereza, aquele que quase virou quartel.

São três propostas:

1) Centro de artes, cultura e tecnologias sócio-ambientais
Projeto de TAMBOR MINEIRO (Maurício Tizumba)/ IETEC EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA / LUME ESTRATÉGIA AMBIENTAL / MUNDO MICO

2) Mercado Mineiro de Santa Tereza
Projeto da Associação do Bairro Santa Tereza com o apoio dos músicos LÔ E TELO BORGES, GABRIEL GUEDES, FLÁVIO HENRIQUE, FLÁVIO VENTURINI E MURILO ANTUNES


3) Mercado Cultural de Santa Tereza
Projeto da parceria entre o GRUPO GALPÃO, GRUPO GIRAMUNDO E AGENTZ PRODUÇÕES

Ainda não me decidi, mas já adianto algumas observações: as propostas 1 e 2 são muito pouco claras quanto ao orçamento. Não consegui descobrir o valor exato do projeto, que pode ir, segundo edital, de 700 mil a 12 milhões. A terceira proposta tem o valor de 12 milhões (u-lala!), que até acredito poderem ser captados via leis de incentivo, dado o peso dos nomes dos proponentes. No entanto, ainda estou me perguntando se a mudança de endereço do Galpão Cine Horto, do Museu Giramundo e a criação de um espaço circense, seriam de interesse público maior do os objetivos principais das duas outras propostas.

Como entre os nossos leitores há um consultor em estratégia, algumas pessoas da área da cultura e mais um monte de sabidos, coloco aqui os meus dois pontos e espero os comentários :
_Cibbele Carvalho_

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Post Agradecimento

Escrevi esse texto em outra oportunidade para a minha amiga e super artista Sil Falqueto. Achei oportuno publicar aqui. É dela o nosso (lindíssimo) template. Não era pra menos_ bióloga por formação, mãe e artista por vocação, ela tem tudo a ver com o quintal. Então foi ela quem traduziu o Quintarola em linhas e cores. Lá vai o texto:

Silvia Falqueto é como uma de suas mulheres-personagens. Tem grandes olhos abertos, mas que facilmente se fecham para uma visão interior. Sua obra traz igualmente as minúcias da natureza_ bichos e plantas e muitas paisagens interiores. Duas faces de uma só. Poderia ser muito sóbrio se fosse só uma idéia, mas não é. É o traço solto da alegria simples, silenciosa, cotidiana e gratuita. A alegria desprovida do imediatismo das cores substantivas, encharcada de adjetivos. Mais avermelhado que vermelho. Aproximadamente como tudo é. Anote aí: Sílvia Falqueto_você ainda vai querer uma na sua parede!
Obrigada, Sil!

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Aproveito para saudar a Clau por ter embarcado nessa comigo. Algumas brincadeiras ficam bem mais legais em conjunto.

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É bom estar cercado por quem a gente admira!
_Cibbele Carvalho_

domingo, 9 de novembro de 2008

O Museu Ettore Guatelli


Numa cidadezinha perto de Parma, Itália, a mais ou menos uma hora de Milão, existe _ e resiste _ um Museu diferente de todos os outros que já vi. Porque não é um museu de objetos ou obras raras e "importantes". É o museu das (in)nutilidades. Escrevi (in)utilidades, assim, porque os mais de 70 mil objetos expostos, um dia foram utilíssimos e ajudaram a construir toda uma civilização de camponeses italianos. Hoje, poderiam ser considerados lixo. Não foram restaurados, nem limpos, muito menos lustrados. Foram apenas cuidadosamente recolhidos. Não estão em vetrinas, mas sujeitos às ações naturais, ao pó, ao toque, ao tempo que continua a torná-los, a cada dia, mais significativos.
No Museo Ettore Guatelli esse "lixo" é lindamente disposto e organizado como se fossem desenhos nas paredes, em composições marcantes e surpreendentes, que fazem o viajante, opa!, o visitante, perder o fôlego. São simples e cotidianos objetos de casa, roupas, móveis, instrumentos de trabalho, brinquedos, e um outro sem-fim de categorias entrelaçadas. Cada um com a sua singularidade que é dada, justamente, pelo conjunto. Uma rede infinita de "significados significantizados", como uma linguagem ou uma bela canção. Coisas que só existem a partir da interpretação, da criação de quem um dia com elas se relacionou e, agora, de quem com elas ainda insiste em se relacionar, para fazer história, para dar sentido.
Mas - vocês podem estar se perguntando - o que tudo isso tem a ver com a temática proposta neste blog? Com o Quintal (enquanto símbolo e sobretudo enquanto signo da auto-projetação infantil), com a Infância, com a Cultura da Criança?
O Museo Guatelli é lugar político para as crianças modernas. É lugar sagrado para ir e levar os pequenos. O Museu Guatelli é um Quintal em forma de museu. Cada pessoa _ e cada criança principalmente! _ que vai ali, recebe lições profundas de criação, de História Vivida, de interação, de registro, de transformações, de impermanência, de diferença (que não precisa ser desigualdade), de poesia, enfim, de Vida. Porque, como dizia o sábio senhor Guatelli, adorador dos objetos, que os recolheu durante mais de 70 anos e depois os organizou no Museu, "as coisas tem vida". Esses lugares de coisas vividas e por-viver podem significar muito pra um Sujeito perdido num mundo fragmentado como o nosso, principalmente, repito, para as nossas crianças. As crianças que ainda brincam no Quintal - e as que brincaram um dia - sabem muito bem essa lição da vida das coisas, dos espaços, da natureza. As que não tiveram mais esse Reino, podem descobri-lo ainda, em espaços como o Museu Guatelli.

Este é meu texto de inauguração desse novo projeto que aceitei fazer junto com a Cibele. Comentários serão muitíssimo bem-vindos. O bom de um blog é fazer conspirações...
Sintam-se em casa _ aliás, sintam-se no quintal de casa _ pra jogar conversa fora com a gente.

_Claudia Souza_








História do quintal

A moradia é um discurso e seus significados. Cada parede, uma frase. Cada casa, um texto inteiro. Uma casa fala por si mesma. Da mesma forma, seus cômodos, a varanda, os corredores e, porque não, a quintarola.

Um grupo constrói a moradia que lhe é peculiar. A terra é carregada pelo desejo-braço de alguém ou por um grupo de alguéns. A terra pode ser também carregada por um alguém que não tem (nem desejo, nem casa, nem liberdade). A terra faz o muro em taipa, já que ainda não nos inventaram o tijolo cozido. O espaço é determinado por esses muros, por fronteiras, por oposição.

O espaço do quintal é designado pela organização da cidade-colônia, que concede terrenos calculados pela metragem linear da fachada e não pela metragem quadrada, surgindo assim vários terrenos retangulares, com grandes áreas ao fundo.

Quintal: pequena quinta ou a quinta parte do terreno. Galinhas, porcos e árvores frutíferas o habitavam. Mulheres e escravos trabalhando. Crianças circulando. A cozinha dos cozimentos demorados e muito quentes. A casinha. Não compartilham dessa origem os quintais do além-mar, dado que nossa província destina-se (ou é destinada por outrem) à exploração e não ao povoamento. A produção brasileira enche caravelas rumo ao mercado externo, exigindo que cada casa fosse não só lugar de morada e abrigo, mas espaço de cozimento, de plantações e criações, que atendessem as necessidades mais urgentes.
Essa origem do quintal na arquitetura brasileira nos dá pistas do espírito quinteiro de que queremos falar...

Nossa quintarola é espaço velado aos visitantes de cerimônia. Para eles, oferecemos a varanda ou a sala de estar. Nossa quintarola está aberta a quem quiser se dependurar no muro para prosear, trocar ou emprestar xícara de trigo. Nossa quintarola (entre muros, mas aberta ao céu)recebe de alma inteira.
Importante citar duas fontes sobre a origem dos quintais na arquitetura urbana brasileira:
1) Os estudos para o doutorado do arquiteto Luis Octávio da Silva ;
2) O terceiro capítulo deste livro.
3) Inspiração vinda desta matéria.
_Cibbele Carvalho_

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Chegando

Só um pé primeiro. Pra sentir a temperatura e a textura do chão.
 
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