segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Mulher que ensina, criança que aprende

Sherazade Escrever para crianças é basicamente uma atividade feminina. Mesmo se existem diversos (e importantes) escritores homens, se não me falha a observação, a maioria avassaladora de autores de livros infantojuvenis é de mulheres. O mesmo para as editoras voltadas para este público, cujas diretoras são principalmente mulheres.

Como consequência, temos um ambiente muito próximo àquele educacional, onde a grande maioria são também mulheres. Não é de se estranhar então a tendência de colocar a literatura “a serviço” da pedagogia, considerando ao mesmo tempo o texto literário um instrumento pedagógico e a criança-leitora como aluno. De fato, a grande maioria dos livros infantojuvenis publicados no Brasil hoje têm caráter nitidamente “educativo”, sendo a Escola o maior consumidor do Mercado Editorial. É o primitivo (arquetípico) binômio mulher que ensina-criança que aprende em plena ação.

Coisa pra ser amplamente questionada. Literatura não é coisa pra viver amarrada, mas para “amarrar”, no sentido de envolver, como bem fazia Sherazade nas Mil e Uma Noites (imagem).

Que ensina, claro que ensina: há muito tempo aprendi que buscar a verdade na literatura é muito mais útil que buscá-la nos fatos (isso vale pra História, pra Socilogia, pra Psicologia…). Mas uma Literatura Infantojuvenil que se preze é muitas vezes anti-pedagógica, politicamente incorreta, violenta, fiel apenas aos princípios (e aos desvios) da própria narração. Fazer boa literatura, principalmente para crianças, é contar as histórias como são, sem nenhum objetivo secundário que submeta este importante ponto de partida. Sob pena de perder o significado e a força.

Tome-se como exemplo os contos populares. Desde os mais antigos, os contos de fadas, escritos a partir da tradição oral. Compare a versão dos Irmãos Grimm (Alemanha) com as de Charles Perrault (França), ambas do final do século XVII, início do século XVIII. Enquanto os irmãos alemães se deixam levar pelo deleite dos elementos simbólicos que só fazem enriquecer sua narrativa, seu contemporâneo francês as utiliza como “instrumento de moralização e educação”. Não é difícil avaliar a diferença da força de uma e de outra versões dos mesmos contos.

Quando um escritor (e principalmente uma escritora) renuncia a ensinar, tem muito mais chances, na minha opinião, de produzir textos que falem diretamente aos pequenos leitores, para além do lugar de aluno.

_Claudia_

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Sexta-feira é dia de link: Filmes africanos, caribenhos e afroamericanos


O IMAGEM DOS POVOS, dirigido por Adyr Assumpção, disponibilizará, durante 14 dias para escolas, associações comunitárias e organizações culturais o acesso gratuito via internet ao repertório de filmes africanos, caribenhos e afroamericanos. A iniciativa do festival faz parte também das atividades comemorativas do mês da consciência negra.


Envie um e-mail para iptv@imagemdospovos.com.br e solicite seu cadastro. A programação é gratuita e estará disponível de 29 de novembro a 12 de dezembro aqui.
_Cibele_


Dica da querida e sumida Carlandréia Ribeiro! Figura bacana e atriz sensacional, diretamente do facebook.


Como chove nessa cidade...


Bom fim de semana,


_Cibele Carvalho_

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

FESTA NO QUINTAROLA

Apertadas de costura, perdemos 3 comemorações ao mesmo tempo. Mas como sempre fomos chegadas num desaniversário...

Primeiro pra minha querida sócia, mais de um mês atrasado (24/10), mas com muito, muito carinho!



Depois pro Quintarola, que fez aniversário dia 06 de novembro. Dois anos de um espaço que representa muito pra mim e pra sócia. Só pra contar um pouquinho da nossa estória, conheci a Claudia pela internet. Diz ela que nos envolvemos pela escrita. Faz sentido. Daí pra nos envolvermos pela fala e pelo abraço foi um pulo. Estávamos as duas fazendo as malas. Ela deixava pra trás uma história linda como educadora (inesquecível, aliás) em Belo Horizonte, eu para acompanhar meu marido numa andança que só terminou esse ano. O meu caminho era voltar, o dela era ir mesmo. Mas o Quintarola sempre foi um lugar de estar com aquilo que a gente acredita, independente da língua, independente do clima. O lugar em que nunca fomos forasteiras, porque o chão eram as nossas convicções. Com muito e muito carinho, uma homenagem para esse lugar!



E finalmente, num momento eu e meu umbigo, parabéns pra mim mesma, que fiz mais (mas só um pouco mais) de trinta num dia 20 e ensolarado de novembro, seguido de uma noite de lua cheia.





: )





_Cibele_

Vivendo e aprendendo a jogar _parte 2

Não acompanho esporte, mas fui assistir ao filme do Senna, acompanhando meu marido. Do ponto de vista do cinema, é uma das piores coisas que já vi. O roteiro é uma colagem cronológica grosseira e a sensação de que valeu a pena ter assistido, se deve só e unicamente à história de um cara muito competente naquilo que se propunha a fazer dentro de um jogo espúrio.

A tensão entre a competência de um indivíduo contra um sistema de cartas marcadas, coerente a várias situações micro e macropolíticas, se dá pela ameaça do cinismo garantidor da ordem ou do aniquilamento do sujeito. Ambos resultados igualmente indesejáveis.

É certo que qualquer discussão ética ou política já se relaciona, por princípio, com a infância, mas passo a frente, vez em quando alguns exemplos caem no colo.

Não há educador que não saiba da importância do brincar, sobretudo na primeira infância. Contudo, a maioria das escolas tradicionais de Belo Horizonte aderiu completamente a ideia da alfabetização até os 5 anos, o que se reflete sobretudo nos exames de seleção.

Surpreendidas, as escolas “alternativas” (não alternativas às pedagogias mais modernas, mas alternativas às políticas que atendem a outros interesses que não a própria educação) se veem em uma situação cuja equação tende a duas resultantes arriscadas: ou acolhem o risco de estarem fora do sistema ou se adequam só o suficiente para terem fôlego de protestar. Não considerarei aqui o cinismo uma resultante válida. Tampouco o aniquilamento total do projeto de uma educação infantil coerente com o que se sabe sobre as crianças. Para as duas soluções válidas, ainda dois riscos. O primeiro, da própria sobrevivência e o segundo, da incoerência. Decisões difíceis.

Voltando ao Senna, é o inicinho do filme, ele e os pais dando uma entrevista em que a mãe declara algo mais ou menos assim: “Foi um bom ano de trabalho e isso é mais importante do que os títulos. Foi um bom ano sobretudo de trabalho honesto.”

O que não impediu que o piloto no Japão, em 1990, jogasse o jogo contra o qual ninguém queria protestar.




Quem de nós ao fim do ano poderá dizer que teve um bom ano de trabalho?

Cibele

terça-feira, 23 de novembro de 2010

O fácil e o difícil, o pronto e o inacabado…

Queridos pais e mães leitores, me dêem licença. Maaaas... é uma pergunta que não quer calar. E ao mesmo tempo um lamento depois de tantas experiências negativas.

Por que os pais e mães de crianças pequenas e nem tão pequenas (e sua extensão, alguns educadores) são tão vaidosos? Por que querem/exigem o resultado da produção perfeita, certinha, lustrada, “reparada” dos filhos/alunos? Será que não percebem que “consertando aqui, mexendo ali, ajustando acolá" tiram completamente a autenticidade dos trabalhos das crianças? Que exigir o término, marcar o tempo pode tirar a força da obra? E mais, que centrando-se sobre o resultado tiram delas a chance imperdível de viver a grandeza do PROCESSO?

Escutem, queridos pais, o que diz uma educadora meio "passada" mas ainda na ativa. Muitas vezes as crianças não se importam em terminar um desenho, uma construção, até um texto. Porque se divertem e crescem ENQUANTO trabalham, enquanto produzem, enquanto criam, sem a pressão, a vaidade e a pressa de ter de terminar. Muitas vezes também o “fácil” (geralmente o que vem amarradinho em métodos didáticos definidos) não agrada nem desafia, e elas preferem o “difícil”, o desconhecido, o a-construir. Preferem inventar novos modos, novas possibilidades, novas combinações.

Se a gente deixa, eu juro! a criança não PRECISA terminar. Nem menos pega o caminho mais curto, mais pragmático, mais apressado. Se a gente aceita, elas generosamente nos oferecem um resultado muito diferente do esperado: o inusitado de sua constante descoberta.

Tentem!

_Claudia_

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Leitura imperdível

"Quem tem medo do Bicho-Papão" é um texto muito, muito bonito do Luiz Tarlei de Aragão, antropólogo da UNB.

"É bem verdade que chega a ser um "luxo", a paternidade em sociedades modernas, onde, como super-heróis mal enjambrados assumimos com exclusividade essa condição de genitores, locus privilegiado de uma lei super-potente."

"...perdemos a capacidade de sermos pais dos filhos dos outros e com isso criamos de vinte anos pra cá um exército de órfãos, que por mais irônico que possa parecer, é filho de uma dupla "carnificina" simbólica."

São alguns trechos sobre o lugar incômodo que a criança tem ocupado na sociedade. Cheio de memórias, belezuras e sensatez, o texto trata dessa orfandade explícita e do papel social do medo:

"De toda essa panóplia aterrorizante, certamente os mais eficazes e generalizados, que eu chamaria de "universais paralizantes" de nossos meninos e meninas, era o trio: Bicho-papão, Lobo-mau e Capeta, por razões que até os psicanalistas, muito mais que os antropólogos e outros "ólogos", poderiam considerar a título de compreensão, ou lazer. Acho que esses bichos e a própria propedêutica ligada a eles está desaparecendo,despencando ladeira abaixo; na curva que o mundo está dando certamente saltarão fora dos trilhos de nossa civilização, para dar lugar a outros, de outros nomes, certamente menos poéticos."
E o que é melhor, disponível aqui.
_Cibele_

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Sexta-feira é dia de link

O material educativo da Bienal de São Paulo, disponível aqui, é imperdível para quem foi e quem não foi.

_Cibele_

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

As princesas segundo os gigantes, as bruxas, os pais omissos e as madrastas

Sarm Chair/ Jéssica Harrison

Quando acho que o assunto Psicanálise dos Contos de Fadas já está dando marcas de puído, um texto da Maria Rita Kehls me faz pensar sobre o narrador dos contos, os pais. Acho que outros tantos títulos podem ser produzidos pensando exatamente sobre que tipo de emoções são produzidas nos pais ao lerem os contos para seus filhos.

Devo dizer que da minha parte reina ambiguidade. Um certo incômodo por estar do outro lado, quando não consigo eu mesma me identificar com o frágil protagonista que ganhará no final. Então há essas duas leituras: a leitura em que me coloco no lugar do herói (embora esse nome não seja bom) e a leitura em que não conseguindo tal façanha, só me resta ser a madrasta.

_Cibele_



terça-feira, 16 de novembro de 2010

3 versos aos 8 anos


Contam que Bashô, o mestre do hai kai, quando decidiu viajar para conhecer outras naturezas, recebeu reação negativa de seus discípulos. A esse protesto contra a sua ausência, o mestre responde assim:

— Não tenho mais nada pra ensinar a vocês, qualquer dúvida que vocês tenham, perguntem para uma criança de 8 anos.

Isso e muito mais nos conta Alice Ruiz no prefácio do livro Conversa de Passarinho, disponível na íntegra lá no Pedro Doria.
Quando li o post, não resisti, chamei a minha filha de quase 8 para fazer o teste. Outras mães já tinham me avisado de tal fenômeno. Imagina, há anos atrás, eu fiquei 15 dias com a própria Alice Ruiz numa Oficina em Ouro Preto me esforçando para sintetizar uma imagem em 3 versos e até 17 sílabas. Tentando me desfazer das abstrações, do eu e do meu filosofês. Não foi fácil, não, mas a mesma opinião não teve a menina que apenas com uma indicação _escrever uma imagem em 3 versos_ encheu a folha na mesma hora:
Cobra nadando na lagoa
Jacaré boiando
A lagoa grita
Uma pessoa nascendo
Uma pessoa morrendo
Na metade da vida
Uma porta aberta
Uma porta fechada
Uma porta abrindo
Comprei o livro pra ela, quem sabe não sai uma resenha crítica.
_Cibele_

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

História da Infância

A mais famosa é a do Philippe Ariès (1960), que todos vocês já devem ter lido, segundo a qual a consciência de infância era ausente na sociedade medieval; tão logo conseguisse viver sem a assistência direta da mãe ou substituta, a criança entrava diretamente na sociedade adulta. Esta tese é fundamentada principalmente na análise da Arte medieval, em que as crianças são representadas como adultos em miniatura.

Alguns autores alargaram esses estudos: deMause (1974), Shorter (1977), Stone (1977).

bambini 1900

Outros criticaram a visão de Ariès: Garnsey (1991), Hanawalt (1993), Shahar (1990) e principalmente Linda Pollock (1983), em seu interessante livro Forgotten Children. Nele a autora questiona a modalidade indireta com que os dados foram recolhidos nos estudos de Ariès e seus seguidores e defende que os mesmos devam ser recolhidos sobretudo em fontes mais diretas, como diários, autobiografias, artigos de jornal e atos de tribunais relativos a processos envolvendo crianças e adolescentes. Através destes documentos, a autora alega ter encontrado uma visão da História da Infância muito diferente daquela de Ariès. Segundo Pollock, a idéia de infância não só existia desde épocas muito longíquas como foi sempre um pré-requisito para a sobrevivência das sociedades humanas.

Barbara Hanawalt traçou um quadro da vida de crianças e jovens na Londres dos séculos XIV e XV, Lester Alston dedicou-se ao estudo das crianças escravas nos Estados Unidos e Elliot West estudou as crianças imigradas naquele país entre 1880 e 1900; outros estudos que merecem ser lidos.

E quem sabe desdobrados em novas pesquisas…

_Claudia_

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Cinema DE criança

Pequeno Cineasta

_Claudia_

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Exemplos

Simpsons Mais que o que dizemos, o que mostramos, muito mais que o que ensinamos, as crianças tem o dom de captar quem somos de verdade. O que os adultos próximos pensam e sentem no fundo (e que às vezes até gostariam de esconder).

Por isso que os filhos agem segundo o sentimento (o desejo) dos pais. Que a menininha se recusa a abraçar a amiga com quem a mãe está ressentida.

Que os grupos de crianças agem segundo o sentimento (o desejo) do educador: os grupos de crianças pequenas quase “adotam” a personalidade do educador.

Não adianta fingir, querer ser politicamente correto, porque se você é racista, ou classista, ou elitista ou consumista ou tudo ista seu filho (ou aluno) vai manifestar isso de algum modo. E você vai se ver num espelho meio exagerado e bastante incômodo.

Basta “perceber” – não sei como elas percebem tão bem – alguma coisa no nosso íntimo e lá se vão elas adiante, construindo suas concepções, suas perspectivas, sua posição no mundo.

Olhar pra dentro de nós mesmos e tentar nos enxergar através delas é o grande desafio que nos trazem as crianças.

_Claudia_

domingo, 7 de novembro de 2010

Vou de link também

Também vou postar um link. Esse artigo do Denis Russo diz tudo que eu gostaria de dizer nesse domingo de chuva.

Não tá nada fácil ser criança nesse tempo e nesse espaço.

Bom domingo a todos!

_Claudia_

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

O discurso e os discursos

Eu queria destacar só esse trechinho do discurso que motivou o meu último post:

A igualdade de oportunidades para homens e mulheres é um princípio essencial da democracia. Gostaria muito que os pais e mães de meninas olhassem hoje nos olhos delas, e lhes dissessem: SIM, a mulher pode!
Colo abaixo o discurso na íntegra, pra não ter que linkar o uol/FSP e suas sutilezas rancorosas:
Minhas amigas e meus amigos de todo o Brasil,

É imensa a minha alegria de estar aqui.

Recebi hoje de milhões de brasileiras e brasileiros a missão mais importante de minha vida.

Este fato, para além de minha pessoa, é uma demonstração do avanço democrático do nosso país: pela primeira vez uma mulher presidirá o Brasil. Já registro portanto aqui meu primeiro compromisso após a eleição: honrar as mulheres brasileiras, para que este fato, até hoje inédito, se transforme num evento natural. E que ele possa se repetir e se ampliar nas empresas, nas instituições civis, nas entidades representativas de toda nossa sociedade.

A igualdade de oportunidades para homens e mulheres é um principio essencial da democracia. Gostaria muito que os pais e mães de meninas olhassem hoje nos olhos delas, e lhes dissessem: SIM, a mulher pode!

Minha alegria é ainda maior pelo fato de que a presença de uma mulher na presidência da República se dá pelo caminho sagrado do voto, da decisão democrática do eleitor, do exercício mais elevado da cidadania. Por isso, registro aqui outro compromisso com meu país:

Valorizar a democracia em toda sua dimensão, desde o direito de opinião e expressão até os direitos essenciais da alimentação, do emprego e da renda, da moradia digna e da paz social.

Zelarei pela mais ampla e irrestrita liberdade de imprensa.

Zelarei pela mais ampla liberdade religiosa e de culto.

Zelarei pela observação criteriosa e permanente dos direitos humanos tão claramente consagrados em nossa constituição.

Zelarei, enfim, pela nossa Constituição, dever maior da presidência da República.

Nesta longa jornada que me trouxe aqui pude falar e visitar todas as nossas regiões.

O que mais me deu esperanças foi a capacidade imensa do nosso povo, de agarrar uma oportunidade, por mais singela que seja, e com ela construir um mundo melhor para sua família.

É simplesmente incrível a capacidade de criar e empreender do nosso povo. Por isso, reforço aqui meu compromisso fundamental: a erradicação da miséria e a criação de oportunidades para todos os brasileiros e brasileiras.

Ressalto, entretanto, que esta ambiciosa meta não será realizada pela vontade do governo. Ela é um chamado à nação, aos empresários, às igrejas, às entidades civis, às universidades, à imprensa, aos governadores, aos prefeitos e a todas as pessoas de bem.

Não podemos descansar enquanto houver brasileiros com fome, enquanto houver famílias morando nas ruas, enquanto crianças pobres estiverem abandonadas à própria sorte.

A erradicação da miséria nos próximos anos é, assim, uma meta que assumo, mas para a qual peço humildemente o apoio de todos que possam ajudar o país no trabalho de superar esse abismo que ainda nos separa de ser uma nação desenvolvida.

O Brasil é uma terra generosa e sempre devolverá em dobro cada semente que for plantada com mão amorosa e olhar para o futuro.

Minha convicção de assumir a meta de erradicar a miséria vem, não de uma certeza teórica, mas da experiência viva do nosso governo, no qual uma imensa mobilidade social se realizou, tornando hoje possível um sonho que sempre pareceu impossível.

Reconheço que teremos um duro trabalho para qualificar o nosso desenvolvimento econômico. Essa nova era de prosperidade criada pela genialidade do presidente Lula e pela força do povo e de nossos empreendedores encontra seu momento de maior potencial numa época em que a economia das grandes nações se encontra abalada.

No curto prazo, não contaremos com a pujança das economias desenvolvidas para impulsionar nosso crescimento. Por isso, se tornam ainda mais importantes nossas próprias políticas, nosso próprio mercado, nossa própria poupança e nossas próprias decisões econômicas.

Longe de dizer, com isso, que pretendamos fechar o país ao mundo. Muito ao contrário, continuaremos propugnando pela ampla abertura das relações comerciais e pelo fim do protecionismo dos países ricos, que impede as nações pobres de realizar plenamente suas vocações.

Mas é preciso reconhecer que teremos grandes responsabilidades num mundo que enfrenta ainda os efeitos de uma crise financeira de grandes proporções e que se socorre de mecanismos nem sempre adequados, nem sempre equilibrados, para a retomada do crescimento.

É preciso, no plano multilateral, estabelecer regras mais claras e mais cuidadosas para a retomada dos mercados de financiamento, limitando a alavancagem e a especulação desmedida, que aumentam a volatilidade dos capitais e das moedas. Atuaremos firmemente nos fóruns internacionais com este objetivo.

Cuidaremos de nossa economia com toda responsabilidade. O povo brasileiro não aceita mais a inflação como solução irresponsável para eventuais desequilíbrios. O povo brasileiro não aceita que governos gastem acima do que seja sustentável.

Por isso, faremos todos os esforços pela melhoria da qualidade do gasto público, pela simplificação e atenuação da tributação e pela qualificação dos serviços públicos.

Mas recusamos as visões de ajustes que recaem sobre os programas sociais, os serviços essenciais à população e os necessários investimentos.

Sim, buscaremos o desenvolvimento de longo prazo, a taxas elevadas, social e ambientalmente sustentáveis. Para isso zelaremos pela poupança pública.

Zelaremos pela meritocracia no funcionalismo e pela excelência do serviço público.

Zelarei pelo aperfeiçoamento de todos os mecanismos que liberem a capacidade empreendedora de nosso empresariado e de nosso povo.

Valorizarei o Micro Empreendedor Individual, para formalizar milhões de negócios individuais ou familiares, ampliarei os limites do Supersimples e construirei modernos mecanismos de aperfeiçoamento econômico, como fez nosso governo na construção civil, no setor elétrico, na lei de recuperação de empresas, entre outros.

As agências reguladoras terão todo respaldo para atuar com determinação e autonomia, voltadas para a promoção da inovação, da saudável concorrência e da efetividade dos setores regulados.

Apresentaremos sempre com clareza nossos planos de ação governamental. Levaremos ao debate público as grandes questões nacionais. Trataremos sempre com transparência nossas metas, nossos resultados, nossas dificuldades.

Mas acima de tudo quero reafirmar nosso compromisso com a estabilidade da economia e das regras econômicas, dos contratos firmados e das conquistas estabelecidas.

Trataremos os recursos provenientes de nossas riquezas sempre com pensamento de longo prazo. Por isso trabalharei no Congresso pela aprovação do Fundo Social do Pré-Sal. Por meio dele queremos realizar muitos de nossos objetivos sociais.

Recusaremos o gasto efêmero que deixa para as futuras gerações apenas as dívidas e a desesperança.

O Fundo Social é mecanismo de poupança de longo prazo, para apoiar as atuais e futuras gerações. Ele é o mais importante fruto do novo modelo que propusemos para a exploração do pré-sal, que reserva à Nação e ao povo a parcela mais importante dessas riquezas.

Definitivamente, não alienaremos nossas riquezas para deixar ao povo só migalhas.

Me comprometi nesta campanha com a qualificação da Educação e dos Serviços de Saúde.
Me comprometi também com a melhoria da segurança pública.

Com o combate às drogas que infelicitam nossas famílias.

Reafirmo aqui estes compromissos. Nomearei ministros e equipes de primeira qualidade para realizar esses objetivos.

Mas acompanharei pessoalmente estas áreas capitais para o desenvolvimento de nosso povo.

A visão moderna do desenvolvimento econômico é aquela que valoriza o trabalhador e sua família, o cidadão e sua comunidade, oferecendo acesso a educação e saúde de qualidade.

É aquela que convive com o meio ambiente sem agredi-lo e sem criar passivos maiores que as conquistas do próprio desenvolvimento.

Não pretendo me estender aqui, neste primeiro pronunciamento ao país, mas quero registrar que todos os compromissos que assumi, perseguirei de forma dedicada e carinhosa.

Disse na campanha que os mais necessitados, as crianças, os jovens, as pessoas com deficiência, o trabalhador desempregado, o idoso teriam toda minha atenção. Reafirmo aqui este compromisso.

Fui eleita com uma coligação de dez partidos e com apoio de lideranças de vários outros partidos. Vou com eles construir um governo onde a capacidade profissional, a liderança e a disposição de servir ao país será o critério fundamental.

Vou valorizar os quadros profissionais da administração pública, independente de filiação partidária.

Dirijo-me também aos partidos de oposição e aos setores da sociedade que não estiveram conosco nesta caminhada. Estendo minha mão a eles. De minha parte não haverá discriminação, privilégios ou compadrio.

A partir de minha posse serei presidenta de todos os brasileiros e brasileiras, respeitando as diferenças de opinião, de crença e de orientação política.

Nosso país precisa ainda melhorar a conduta e a qualidade da política. Quero empenhar-me, junto com todos os partidos, numa reforma política que eleve os valores republicanos, avançando em nossa jovem democracia.

Ao mesmo tempo, afirmo com clareza que valorizarei a transparência na administração pública. Não haverá compromisso com o erro, o desvio e o malfeito. Serei rígida na defesa do interesse público em todos os níveis de meu governo. Os órgãos de controle e de fiscalização trabalharão com meu respaldo, sem jamais perseguir adversários ou proteger amigos.

Deixei para o final os meus agradecimentos, pois quero destacá-los. Primeiro, ao povo que me dedicou seu apoio. Serei eternamente grata pela oportunidade única de servir ao meu país no seu mais alto posto. Prometo devolver em dobro todo o carinho recebido, em todos os lugares que passei.

Mas agradeço respeitosamente também aqueles que votaram no primeiro e no segundo turno em outros candidatos ou candidatas. Eles também fizeram valer a festa da democracia.

Agradeço as lideranças partidárias que me apoiaram e comandaram esta jornada, meus assessores, minhas equipes de trabalho e todos os que dedicaram meses inteiros a esse árduo trabalho.

Agradeço a imprensa brasileira e estrangeira que aqui atua e cada um de seus profissionais pela cobertura do processo eleitoral.

Não nego a vocês que, por vezes, algumas das coisas difundidas me deixaram triste. Mas quem, como eu, lutou pela democracia e pelo direito de livre opinião arriscando a vida; quem, como eu e tantos outros que não estão mais entre nós, dedicamos toda nossa juventude ao direito de expressão, nós somos naturalmente amantes da liberdade. Por isso, não carregarei nenhum ressentimento.

Disse e repito que prefiro o barulho da imprensa livre ao silencio das ditaduras. As criticas do jornalismo livre ajudam ao pais e são essenciais aos governos democráticos, apontando erros e trazendo o necessário contraditório.

Agradeço muito especialmente ao presidente Lula. Ter a honra de seu apoio, ter o privilégio de sua convivência, ter aprendido com sua imensa sabedoria, são coisas que se guarda para a vida toda. Conviver durante todos estes anos com ele me deu a exata dimensão do governante justo e do líder apaixonado por seu pais e por sua gente. A alegria que sinto pela minha vitória se mistura com a emoção da sua despedida.

Sei que um líder como Lula nunca estará longe de seu povo e de cada um de nós.

Baterei muito a sua porta e, tenho certeza, que a encontrarei sempre aberta.

Sei que a distância de um cargo nada significa para um homem de tamanha grandeza e generosidade. A tarefa de sucedê-lo é difícil e desafiadora. Mas saberei honrar seu legado.

Saberei consolidar e avançar sua obra.

Aprendi com ele que quando se governa pensando no interesse público e nos mais necessitados uma imensa força brota do nosso povo.

Uma força que leva o país para frente e ajuda a vencer os maiores desafios.

Passada a eleição agora é hora de trabalho. Passado o debate de projetos agora é hora de união.

União pela educação, união pelo desenvolvimento, união pelo país. Junto comigo foram eleitos novos governadores, deputados, senadores. Ao parabenizá-los, convido a todos, independente de cor partidária, para uma ação determinada pelo futuro de nosso país.

Sempre com a convicção de que a Nação Brasileira será exatamente do tamanho daquilo que, juntos, fizermos por ela.

Muito obrigada,
***
_Cibele_

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Política, Infância e Gênero



Quando o Obama tomou pose como primeiro presidente negro dos EUA, bem no dia do aniversário da minha filha, escrevi um post pensando no que aquele dia representaria para o futuro das crianças.

Hoje não poderia ser diferente. Confesso arrependida, cometi o equívoco de colocar a minha filha na cama, antes que ela visse a primeira presidenta eleita desse país se pronunciando, um aceno promissor para o lugar da mulher (e das crianças do sexo feminino) nesse país. Mas o farei hoje. Por aqui.

Pensando em como a infância se relaciona com a política, para além da imprescindível reflexão sobre o projeto político para a infância e a educação de cada candidato, recorri à minha própria memória.

A ditadura, só vi nos livros didáticos; o Diretas-já, uma memória muito difusa. O que marcou a minha infância foi a inflação, as compras colossais no início do mês antes que o dinheiro minguasse nas mãos da minha mãe e os cálculos contorcionistas do meu pai para o ajuste da minha escassa mesada. Os candidatos pareciam sempre os mesmos e a desesperança era grande. Lembro ainda a emoção trepidando a voz da minha professora de português na quinta série, quando ela relatava a queda do muro de Berlim e com isso marcava as nossas memórias e tecia a trama dos nossos valores.
Na adolescência, contrariando meu pai, adotei um broche do PT na minha mochila, apelidada carinhosamente, Neide Candolina, famosa por essa homenagem. Nunca entendi direito porque sendo meu pai tão forte na minha formação, tomei caminhos tão diferentes nas minhas convicções políticas. Possivelmente, rascunho hoje, porque já naquela época comecei a desconfiar que a meritocracia tão defendida por ele, não lhe devolvia o que lhe era de direito, dado que sempre trabalhou muito, com uma inteligência rara e uma honestidade incansável. Havia alguma outra força atuando naquela realidade, que não a dedicação e a competência.
Por ver o que era uma quimera de adolescência ganhando contornos nítidos de realidade, ontem fui dormir mais tranquila. Talvez o mundo esteja mesmo mais justo e seguro para minha filha...

... E aproveito para pensar sobre a importância dos líderes na política, nas instituições e porque não, nas escolas.


Bom dia companheiras,

_Cibele_



 
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