quinta-feira, 30 de abril de 2009

Outro ponto de vista...

Com uma visão um pouco diferente, mas muito interessante, o post da Rosely Sayão tem uma conclusão bem parecida

- Declarações de amor aos filhos -

praqueles que, como eu, morrem de preguiça de links, copiei um pedacinho:

os pais – mães, principalmente – têm jogado todas as fichas na relação amorosa que têm com seus filhos, notadamente enquanto eles são pequenos, ou seja, estão sob controle dos pais, cujo amor é possessivo. Detalhe: todo amor tem essa característica, expressa de modos diferentes. Isso se expressa quando dizemos, por exemplo, “MEU amor”, “MEU filho”, “MEU querido” etc.

_Cibele Carvalho_

quarta-feira, 29 de abril de 2009

HiperPais

Recentemente, surgiu um novo “modelo” de pais e mães: os hiperpais (sem hífen, confere?). É o que mostra a matéria da Revista Época. O título também é bem interessante: Pais que amam demais atrapalham os filhos. A ideia é que os pais, zelosos ao extremo na criação dos filhos, acabam por prejudicá-los. Mais ou menos nessa direção, outro dia me chegou uma amiga com uma frase do seu analista que era mais ou menos assim: "quanto menos sentirmos prazer na criação dos filhos, melhor". Será?

Fiquei pensando que esse zelo se exprime muito no desempenho dos próprios pais na função da paternidade/maternidade, não sendo portanto um zelo com o outro, mas um zelo pela promoção da sua auto-imagem. O que está sendo zelado é o desempenho (um certo tipo de desempenho, ponderou a Clau num outro momento) que promova os pais a bons pais. Hiperpais. Embora seja uma ação muito narcísica, é realizada em nome do amor. Esse autozelo (sem hífem, confere?) talvez explique um contraponto a essas presenças tão invasivas: as ausências de valores, de limites, de tempo e outras relíquias.

Corujices são saudáveis. Todo mundo se excede às vezes, pra cá e pra lá, mas se tomado no geral, acho perigoso afirmar que esse novo modelo de pai e mãe ama demais. Ama quem, apesar do próprio desejo dizer o contrário, respeita o direito de ver o filho crescer e de ser ele mesmo. Acho importante essa colocação para que não pareça que os pais mortais amam menos ou que esse sufocamento esteja de alguma forma justificado por uma causa nobre.
***
Fiquei pensando também sobre a competitividade entre mães (apesar das conquistas em outros campos da mulher moderna) e sobre o confortável conceito de mãe suficientemente boa de Winnicott.
***
_Cibbele Carvalho_

É pra já!

Esse CD, "Estica...Dobra", de que assino a produção executiva, é uma das grandes honras do meu trabalho como educadora. E o reconhecimento de entrar na lista da Folha, em tão seleta companhia, é mais-que-merecido.

Foi uma feliz parceria entre o CLIC e o, naquela época recém-criado, Grupo Curupaco, que agora já está voando por aí com outros excelentes trabalhos, em outras parcerias. A Ana Lúcia Braga era professora de música do CLIC e o Paulo Santos, do Grupo UAKTI, era pai de uma das nossas crianças. Aí a coisa aconteceu naturalmente, eu e a Dri resolvemos dar o empurrão de que eles precisavam pra brindar as crianças com boa música, reuniu-se o Grupo e o CLIC produziu o CD.

As canções, a maioria da dupla Ana e Paulinho, nasceram da convivência direta deles com as crianças, o que aparece nas letras e nos ritmos que encantam meninos de toda idade. Eu acho que é porque provocam brincadeiras... Os arranjos são espetaculares, bem de acordo com o estilo do Grupo. Os músicos, nem se fala. Coisa de muita qualidade.

O CD conta com a participação do Coral de Crianças do CLIC, entre elas - ligando a corujice - meu filho Davi, o Caio filho da Ana e do Bruno e a Lisa, que canta sozinha a primeira canção, filha do Paulinho e da Ju. Pra continuar na linha family, vale o registro de que as ilustrações e o projeto gráfico foram feitos pelo meu irmão Antônio Morais, que continua trabalhando com o Grupo Curupaco em seus novos trabalhos (o CD "O Voo do Pterodáctilo" também é imperdível).

_ Claudia Souza _

terça-feira, 28 de abril de 2009

Batata Quente

Aqui vai o link de uma matéria da Folha de São Paulo sobre Percepção Musical, em que consta uma lista de cds bacanas elaborada pelo Palavra Cantada, Teca Alencar de Brito e Hélio Ziskind. Embora a matéria seja de 2005, a lista me caiu na mão essa semana duas vezes...uma numa republicação que vou ficar devendo a fonte e outra num grupo virtual de cultura da infância. Agora, o legal, legal mesmo, é ver o cd do Clic. Quem sabe a Clau não topa falar na experiência?
: )
Cibele

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Meus "negócios"

Que menino nunca recolheu objetinhos encontrados na rua ou fragmentos abandonados pela natureza?

Taí uma brincadeira que apaixona toda criança. Pode ser o início de uma coleção, o sinal de uma mente curiosa e de um espírito científico. Acima de tudo, trata-se uma atividade criativa...

Que nem sempre, vale dizer, é vista favoravelmente pelos pais. Afinal, não e fácil ter a própria casa invadida por pedrinhas, conchas, ramos, folhas e animaizinhos secos ou "pior", tampinhas enferrujadas, pregos, pedaços de lata ou de plástico sujos. Principalmente se a casa em questão é um apartamento no centro de uma grande metrópole. Mas fazer o quê? Pra ser mãe e pai é preciso um pouco de resignação.

Ou mais - se possível. Se quiserem. Não só permitir como estimular essa "arqueologia" que elas fazem. Que tal separar em casa um espaço pro Museu do seu filho(a)? Um espaço pra guardar, catalogar, organizar e mostrar os seus "negócios", um Museu da, e para a, criança, feito segundo as indicações dela.

As crianças nos ajudam a ampliar nossos olhares preguiçosos sobre o mundo. Para descobrir outros pontos de vista, nada melhor que observá-las enquando constróem sentidos inusitados.

"Conservar o espírito da Infância dentro de si por toda a vida quer dizer conservar a curiosidade de conhecer, o prazer de entender e a vontade de comunicar".
(Bruno Munari, 1986)

_Claudia Souza_

sábado, 25 de abril de 2009

Heteronomias

Criança do século XIII, derivado do verbo criar. Guri no sul do país. Belezinha dizia minha vó vinda do sul de Minas. Boy no Norte de Minas. O coletivo é criançada (1899) ou molecada. Eu digo cambada. E gosto muito de ouvir os mininu. Quando incomodam, são chamados pelos paulistas de pentelho. Pirralho, de etimologia obscura. Muito clareador é o adjetivo enfezado. No centro-oeste mineiro, burricido. E pra esse estado de humor birrento, a solução, dizem por aqui, é enterter (vindo de entreter) a criança. Infantil XVII do latim infãns –antis que não fala, de fari falar.

_Cibbele _

Ordem

Eu jogava assim:
01. Ordem
02. Seu lugar
03. Sem sorrir
04. Sem falar
05. Um pé
06. O outro
07. Uma mão
08. A outra
09. Bate palmas
10. Pirueta
11. Atrás-pra-frente
12. Presente

Minha mãe ensinou pra minha filha, assim:
01. Ordem
02. Seu lugar
03. Sem sorrir
04. Sem falar
05. Um pé
06. O outro
07. Uma mão
08. A outra
09. Uma palma
10. Duas palmas
11. Tic tac
12. Coração
13. Descanso
14. Perdão

Ruth Rocha ensinou assim:
01. Ordem.
02. Seu lugar.
03. Sem rir.
04. Sem falar.
05. Um pé (joga a bola e levanta um pé).
06. O outro (joga e levanta o outro pé).
07. Uma mão (pega a bola só com uma mão).
08. A outra (pega a bola com a outra mão).
09. Bate palmas (joga e bate palmas).
10. Pirueta (joga e roda).
11. Atrás-adiante (joga, bate palmas nas costas e na frente).
12. Bate-queda (joga, bate palmas e bate no colo).
13. Perdão (joga e ajoelha).

ROCHA, Ruth. Almanaque Ruth Rocha. São Paulo: Ática, 2004. p.106.

Tudo coreografado, claro... Alguém sabe outro jeito de brincar?

_Cibbele Carvalho_

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Giro rápido

Esse fim de semana, estive num curso com o brincante Levindo Diniz, experiência que garantiu o saldo positivo do feriado depois de dois programas culturais para criança da categoria super roubada. Estive mais quieta, observando tudo e convicta de que o brincar é mesmo, como afirma Lydia Hortélio, o "último reduto da espontaneidade".
Fiquei pensando se o brincar proposto pelas escolas é um brincar genuíno ou mera sabatina disfarçada. E se o ficar quieto, observando é um não brincar. Como é que a escola, principalmente a que determina objetivos pedagógicos pro brincar, lida com a falta de vontade de brincar?
À certa altura, minha mão coreografava livre e distraídamente com o barbante da brincadeira proposta, quando uma colega ao lado me alertou: você arranjou um novo jeito de brincar!
Então fiquei pensando que a gente pensa melhor quando a ideia passa pelo corpo e pelo coração da gente. Mesmo que quietos.
***
No oooutro fim de semana, a convite da querida Fefê, assisti ao espetáculo A Ver Estrelas e gostei muito, feita a ressalva de que o texto (maravilhoso) é um pouco indigesto às crianças muito pequenas, o que não chega a ser ruim, já que poucas produções se ocupam das crianças maiores e dos adolescentes.
***
Bonito demais esse post do Garrocho.
Cibbele Carvalho

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Brinquedos instigantes

A sessão de ciências do Blog de Brinquedo está muito interessante.
Confiram aqui.

_Claudia Souza_

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Fé Cênica

A Paula pediu aqui pra explicar melhor esse conceito.

É um conceito emprestado da Dramaturgia. De fato, o dramaturgo russo Constantin Stanislavski cunhou esse termo pra propor a seus atores que acreditassem muito na ficção e que tentassem buscar dentro de si mesmos elementos emocionais capazes de tornar real o universo ficcional. Assim, um ator stanislavskiano não representa, mas atua, de acordo com seus próprios sentimentos, em favor da personagem. Isso, é claro, provoca no público uma maior crença na verossimilhança da ação. Cada gesto, cada movimento do ator servem para colocar pra fora a verdade do personagem na interpretação. Ter fé cênica, então, é acreditar na cena enquanto é "vivida".

As crianças fazem muito isso, porque como disse muito sabiamente a MaWá aqui, conseguem dançar entre ficção e realidade, "passeiam pela loucura". Nem sempre é fácil. Às vezes saem disturbadas desse encontro justamente por terem acreditado, por terem tido muita fé cênica (lançando mão de muitos sentimentos pessoais) em situações/espetáculos/festas populares que lidam com o absurdo de maneira lúdica. Ou seja, "sabendo" ou não (isso depende da idade) que era uma representação, a realidade dos sentimentos fala mais alto e deixa suas marcas.

É um pouco a coisa de "entrar no jogo" da cena... A gente se diverte muito mais, mas corre o risco de se assustar. O mais interessante é ir puxando o fio da meada do susto: fatalmente você vai chegar num sentimento seu bem escondidinho, que aquela cena ou aquele personagem fazem reviver. A gente não se assusta com tudo que é potencialmente assustador, nem as crianças. O susto, o medo acontecem quando são referidos ao nosso mundo interior. Caso contrário o "assustador" pode ser até cômico. E vice-versa.

Todo mundo se lembra de situações semelhantes quando era criança. Eu me lembro até de uma quando já era adulta! (Uma vez assistindo a um espetáculo do Circo de Todo Mundo, saí literalmente correndo quando uns caras vestidos de gorilas desceram do palco e vieram brincar com a platéia. Foi mais forte que eu, quando vi já estava no corredor! tsc tsc tsc)

Em tempo: a Cibbele entende muito mais de teatro que eu, e está convidada a contribuir pra esse post. Queria muito ter também os comentários do Garrocho sobre o tema.

_Claudia Souza_

domingo, 19 de abril de 2009

Brinquedos de parque

Olhem que interessante esses brinquedos de parque. É uma empresa alemã chamada Richter Spielgeräte GmbH. Eles utilizam principalmente a madeira, mas também metal e pedra. A linha "Sensorial" é simplesmente fantástica, mas gostei de tudo que vi.
A empresa, que faz uma seleção cuidadosa de materiais eco-compatíveis e investe muito em segurança, possui também uma série pensada especialmente para consentir uma melhor fruição aos espaços abertos da parte de pessoas com habilidade diversa.

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_Claudia Souza_

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Coelho e Jesus

No último fim de semana pude acompanhar a comemoração de rua da Semana Santa, tradicional na cidade de Taranto, terra do meu marido. E sempre por perto muitas crianças.

Quando cheguei em casa, encontrei na minha caixa postal um texto desses que circulam pela internet (e que são sempre atribuídos a alguém famoso) onde um menininho fazia perguntas engraçadas aos pais e acabava por concluir que Jesus é o Coelho da
Páscoa. Lembrei de mim mesma, das crianças com quem convivi, pensei nos comentários da Cibbele aqui. E fiquei pensando um monte sobre como as crianças vivem os símbolos que o mundo adulto lhes propõe.

Pensando na questão em primeira pessoa, lembrei do pavor que eu tinha da "Sexta Feira da Paixão". Primeiro porque tinha de ir à igreja beijar os pés do "Senhor Morto". A imagem era horrível, toda ensanguentada, cabelos de verdade... vinha encoberta por um véu como os cadáveres no caixão e, como os cadáveres no caixão era gelada! BRRRRR... As procissões, os ritos, tudo muito fúnebre, me causavam estranhos arrepios. Outra coisa esquisita era que, no meu lar genuinamente católico apostólico romano, nesse dia não se podia falar alto, nem cantar, nem ver TV (não comer carne era só um detahe porque a refeição era um delicioso prato de bacalhau). Meus pais e minhas irmãs mais velhas mantinham uma expressão sempre seríssima na Sexta Feira da Paixão, era como se alguém tivesse realmente morrido naquele dia. Lembro que, querendo rir ou brincar, eu e meu irmão nos escondíamos no fundo do quintal.

Depois pensei nas magníficas conversas entre as crianças sobre Jesus, Deus, coelho, ovo, etc, que já presenciei pela vida afora, absolutamente sem interferir. Conversas que, partindo das comemorações religiosas e dos símbolos disponíveis, acabavam esbarrando no sexo dos anjos, na vida e na morte, de um ponto de vista muito simples e muito complexo, como convém a crianças refletindo.


TARANTO, ITÁLIA 2009

fotos minhas


A coisa em Taranto tem requintes de filme de terror: na quinta-feira, a procissão de Nossa Senhora das Dores, em que a imagem da santa desesperada, vestida de negro, perdida em lágrimas, sai pela cidade procurando o filho morto. Na sexta, outra procissão, agora com diversas imagens que representam a "paixão". A última delas justamente a do velho e bom "Senhor Morto", com o mesmo véu da minha infância.

Compondo o cenário macabro, os "perdoni" (perdões) que são homens encapuçados que andam lentamente por toda a cidade em duplas, descalços, fazendo penitência por seus pecados. Outra coisa de dar medo. O ritmo é marcado pela banda com suas marchas fúnebres e por uma espécie de matraca que soa avisando para andar ou parar. O caminhar é sempre lentíssimo, arrastado, sofredor. Meio pendular. Tudo coletivo, numa espécie de transe.

Vejam nesse vídeo um pedacinho da ação:

De um ponto de vista cultural, é um espetáculo belíssimo. As imagens são obras de arte. A música é linda. O figurino impecável, compondo com o cenário de uma cidade antiga. O clima é todo composto pra uma reflexão sobre a dor. Mas fiquei imaginando tudo do ponto de vista das crianças que assistiam. E logo me pus a lembrar dos meus arrepios infantis.

Porque criança tem fé cênica. Ainda mais se os símbolos se referem a acontecimentos que lhes juram que sejam absolutamente reais.

Eu olhava os meninos e ficava imaginando o que se passava na cabeça deles. Sobretudo imaginava se aquela experiência teria alguma repercussão na vida deles ou se seria apenas um simples espetáculo como é pra mim hoje (embora ainda me faça sentir certos calafrios, acho que continuo tendo fé cênica). Se se faziam perguntas, se levantavam questões como o menino do texto pseudo-verissimiano. Se sim, como será que os pais respondiam. Ou se não respondiam. Como será que aquelas coisas eram vividas em casa. Que outros elementos eles teriam pra configurar as informações, se tinha um contexto ou não.

Não consegui chegar a nenhuma conclusão. Continuo com uma boa sensação de perplexidade.

_Claudia Souza_

terça-feira, 14 de abril de 2009

Jogo da Vida


Nesse feriado, tive nas mãos o Jogo da Vida, que fez história nos anos 80 e que foi relançado pela Estrela. Não sei bem se eu não o conheci ou se dele já tinha me esquecido, mas notei que aquela simulação era impecável na coerência de que um jogo precisa. Porque embora possa partir de uma premissa falsa, o jogo necessita de uma coerência interna, de uma lógica, de relações de validade, e é aí que mora a simulação.

O ganhador é aquele que reúne mais fortuna, já que, anuncia o slogan do tabuleiro, trata-se de um jogo rumo ao sucesso. De forma que, se você ao fim da vida cai na casa “fez um cruzeiro pelo mundo – pague 1045 dinheirinhos”, você estará perdendo e não ganhando. Mesmo que você morra no dia seguinte. No início do jogo, o dado decide a sua profissão. Você pode ser professor e ganhar 20 dinheirinhos, jornalista e ganhar 21 dinheirinhos, físico e ganhar 30 dinheiros ou advogado ou médico e ganhar 50 dinheirinhos. Portanto, se você for professor, tem mais chances de perder o jogo, assim como se você for um médico ou advogado infeliz, não importa...suas chances são boas!

No fim, uma bifurcação: ou você faliu e vai viver como um filósofo no campo, ou vira um milionário.

A lógica é impecável! Totalmente válida. E como sistema, pode ser preenchido pela inverdade ou pelo preconceito que quiser.

E eu que vivo citando a piadinha sobre filósofos de certo episódio dos Simpsons*, não achei a menor graça dessa vez. Não sei se a Claudia concorda, mas eu colocaria o jogo na lista Quintarola NÃO Recomenda.


*Família Simpson frente a tv. Jornal da noite anuncia manchete: A crise econômica é tão grave que não só os filósofos sofrem com o desemprego, mas até as pessoas úteis à sociedade.

De verdade ou de mentirinha?

As crianças dizem muito isso:
- Foi de verdade!
- Vamos fazer de mentirinha?

Elas sabem distinguir um "estado" do outro. Não existe hierarquia, nem virtude, nem moral entre ambos. As crianças gostam tanto do "mentirinha" quanto do "de verdade" na hora de brincar. Se estão jogando queimada e aparece uma dúvida do que aconteceu DE FATO (queimou ou não queimou?) aparecem sempre os juízes de olhos de lince pra apontar "a realidade" (=o que eu vi/interpretei) a despeito de tudo. As crianças querem seguir as regras ao pé da letra. Mas se estão brincando de casinha, ou de médico... "mentir" é a ordem do dia. Basta que seja feito um tipo de contrato entre quem brinca: se o jogo é "de verdade" ou é "mentirinha". Tudo resolvido.

O tempo do "mentirinha" é todo alterado. Parece que flutua, nunca É, mas ERA.
- Então eu era a mãe.
- E aí eu saía da casa e ia fazer as compras.

O espaço é amplo, mágico, onipotente, o mundo gira em torno de quem atua. Os objetos assumem outras funções, as palavras outras significâncias muito mais pessoais. As ações vão se desenrolando ao bel prazer de quem as faz mas também de todo mundo (e aí pode ser que resida a socialização, dentro de um emaranhado tão subjetivo). Parece uma realidade paralela, mas é tão real quanto o que a gente sente. Aqueles sentimentos lá no fundo do peito, aqueles que a gente prefere guardar, aparecem e "de mentirinha" são sempre bem-vindos.

É estranho pensar que, pra entrar num contato estreito com os nossos sentimentos, a gente precise "mentir". Será que a Razão não comporta as interpretações pessoais e sensíveis da Vida?

_Claudia Souza_

segunda-feira, 13 de abril de 2009

A/C setor de recursos Humanos


Escrevi um e-mail para a Clau e recebi uma resposta automática dizendo que ela estava de férias pascalinas, sem acesso à internet, até dia 13 (hoje). Será que o setor de recursos Humanos do Quintarola pode me explicar esse mal entendido?

Guarda-roupas e armários


foto minha

Quando damos aos objetos a amizade que convém, não abrimos o armário sem estremecer um pouco. Sob sua madeira ruiva, o armário é uma amêndoa muito branca. Abri-lo é viver um acontecimento de brancura. Gaston Bachelar

O lugar onde eu mais gostava de me esconder era no armário do meu irmão. Atrás das calças dependuradas no calceiro, eu me esquecia de mim, cercada pelo cheiro das roupas passadas e organizadas. O guarda-roupa da minha infância não tinha cheiro de passe bem, nem de lavanda, nem de naftalina. Tinha cheiro de madeira e de gente.

A Lúcia, por exemplo, foi se esconder num guarda-roupa que não era da casa dela e parou em outro mundo. Já a minha afilhada Ana Luisa, ficou com medo do guarda-roupa da casa da minha mãe e me fez me esconder de novo ali com ela fortemente abraçada ao meu pescoço.

Os guarda-roupas são órgãos vitais numa casa. Neles guardamos nossas intimidades e nossas memórias-gavetas. Os armários das crianças possuem particularidades_ São sempre povoados por roupas de uma só primavera. Contra o tempo e o crescimento acelerado delas, as barras sobem e descem e os joelhos ganham remendos. As costureiras que se dedicam a reformar roupas (profissionais quase tão raras quanto os ambulantes amoladores de facas), são grandes amigas da infância. Às vezes, as crianças se apegam a alguma peça (ou circunstância) que não lhes cabe mais. Usam assim mesmo, acima das canelas ou mostrando o umbigo. Até que chega uma hora em que não tem mais jeito, é preciso mudar de casca.

Alguns pavores das crianças : roupa nova e roupa de irmão mais velho. Roupa nova porque etiqueta espetando e experimentar são duas coisas chatas demais. Roupa do irmão mais velho porque dificulta a árdua tarefa que é se diferenciar do maior e porque até que de vez em quando, roupa nova é bom...mesmo com etiqueta espetando e tendo de experimentar. Ah, e quando dois irmãos são igualmente vestidos? Eu não gostava...
Se bem que às vezes, surrupiar a roupa do mais velho só pra ter o gostinho de ser maior pode ser providencial (ver o conto "Os Quedes Vermelhos da Tchi", do já aqui exaustivamente citado, Ondjaki). E passar horas desfilando com as roupas e os sapatos da mãe? A minha vivia cheia de anéis que ela retirava cuidadosamente antes de cozinhar e guardava em cima da pia de mármore branco. Eu gostava de subir num banquinho feito pelo meu avô e experimentá-los nos meus dedos, mesmo sabendo que ainda não me serviam. Nem só de tempo encurralado vive a infância.

Desconfio que as crianças que andam muito na moda, que seguem a efemeridade da moda e obedecem à risca os símbolos adultos, não poderão brincar com o tempo e talvez deixem escapar pra sempre a chance de se perder entre casacos e se achar coroada _ a destemida.
_Cibbele Carvalho_

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Infância no Interior

foto minha

Nas minhas andanças pelo interior de Minas, tenho observado que a infância também tem se modificado longe dos grandes centros. Ainda é verdade que o trânsito é menor e que as cidades são menos violentas, no entanto, a constatação de que o interior carece de acesso à boa educação escolar foi suficiente para abrir portas para as grandes redes de ensino e aos selos de qualidade pedagógica. A educação franqueada pouco observa a cultura local e as escolas de interior sofrem deturpações de toda ordem na tentativa de seguir o modelo. Comemorar o dia do aniversário da cidade não é suficiente. Cada escola deveria perceber as características do seu público e suas demandas e se permitir ter uma identidade.

Na melhor escola de uma cidade do Norte de Minas, as crianças desde o maternal permaneciam sentadinhas em suas mesinhas e saíam do prédio apenas para o recreio ou para a educação física duas vezes na semana. Aliás, educação física na escola infantil é uma coisa que já me deixa com uma pulga atrás da orelha!

Depois percebi que numa cidade pobre e distante da capital como aquela, era a vontade de oferecer acesso às informações, de se aproximar dos valores da capital (ainda que de forma predatória e sem critério) é que punha em risco o brincar. O tempo escolar não era para brincadeiras, já que a maioria das famílias morava em casa. Não havia livrarias e as compras pela internet eram impossibilitadas pelo alto valor do frete. Observando com um pouquinho mais de atenção, pude perceber que, embora aquelas famílias tivessem quintal à vontade, não valorizavam mais o corpo e as brincadeiras. As crianças eram muito pouco desenvolvidas no aspecto motor. Prevaleciam as brincadeiras de faz de conta, a televisão e o vídeo-game. No clube, os pais se revezavam atrás das crianças de quatro anos em piscinas infantis cuja água lhes chegava às canelas. Mamadeiras, bicos e tatimitates eram cuidadosamente preservados.

Apesar disso, no inverno, a cidade era tomada de novo pela sua grande vocação perdida. Algumas poucas faixas eram espalhadas em pontos estratégicos: Dias 4 e 5 Quermesse de São Geraldo. E apenas essas informações bastavam. Não a nós, forasteiros, que precisamos parar algumas vezes perguntando onde e a que horas.

Em outras cidades, mudam um pouco as cores, mas posso garantir que aquela ideia de infância de interior, livre e simples, está na lista das que correm seríssimo risco de extinção.
Mas talvez nas periferias...
_Cibbele_

A respeito dos "objetos vivos"...

... encontrei esta pérola (entre as muitas) de Saramago.

http://caderno.josesaramago.org/

Essa conversa já passou por aqui e por aqui.

_ Claudia Souza_

Tangolomangos e afins

Outra construção oral muito presente na Cultura da Criança - que eu gosto mais ainda que das parlendas - são os tangolomangos. A escritora e ilustradora mineira Angela Lago usa e abusa deles. A Bia Bedran também. Conhecem a "História da Coca"? E a da "Velha a Fiar"?
(Obs.: Não deixem de ler os artigos no site da Angela, são estupendos.)


Tem também os trava-línguas, os versinhos, as adivinhas, as charadas, as anedotas, as línguas do P, do plim, das vogais, as terminações divertidas ("Cibele ele de quitiripele corta mato ele de firinfinfele...") e até os slogans que elas escutam na TV e repetem o tempo todo. São as crianças dando seu sentido lúdico à linguagem.

_Claudia Souza_

domingo, 5 de abril de 2009

Parlendas desde sempre

As parlendas - aqueles jogos orais tradicionais que as crianças usam pra escolher, sortear ou simplesmente exercitar a língua - têm uma função mais importante que se possa imaginar.

Uni duni tê
Salamê minguê
O sorvete colorido
O escolhido foi você...

Como cadeia de palavras - de significantes, portanto - podem ser comparadas à música e à poesia como arte e como representação de sentimentos, onde o que predomina é a sonoridade mas a escolha das palavras não é absolutamente em vão.

Lá em cima do piano
Tinha um copo de veneno
Quem bebeu, morreu
O azar foi seu!
Crianças muito pequenas se apropriam das parlendas e, na medida em que crescem, vão usando essas construções como referência em suas investigações sobre a linguagem oral e escrita.


Panderolê depan depi
E´de pate ruge
Panderolê depan depi
É de pate gri.

Parlenda é mais que versinho: pode ter como pode não ter rima, mas sempre tem ritmo. A fala na parlenda flui quase espontânea, com consistência e com coragem, sem muito pesar e sem muito pensar. É um passeio da sensação sobre a Razão que dá certo.

Tic-tac, carambola
Ela dentro, ela fora...
As parlendas são encontradas na Cultura da Criança há muito, muito tempo. E sobrevivem, modernizadas, nas brincadeiras de mãos entre-cruzadas. Não é raro vermos ainda hoje crianças inventando parlendas enquanto brincam. Valeria a pena um registro dessas invenções, que algumas vezes se perdem no acaso.

_ Claudia Souza_

sexta-feira, 3 de abril de 2009

35 vitórias e os jogos gráficos

Lembram do 35 vitórias? Ondjaki me descreveu a brincadeira por e-mail assim:

Muitas regras, joga-se na areia, com desenho no chão, e basicamente a pessoa tem de dar 35 voltas sem ser atingido por uma bola de trapos, pequena, que normalmente é atirada pelos jogadores ‘inimigos’ a uma incrível velocidade e pontaria.... Jogo normalmente feito por meninas, mas alguns meninos também jogavam, no intervalo das aulas.... No suor dos dias...... No tempo entrecortado entre sonho e encantamento....... Em Luanda....... Na escola Ngola Kanini............ Era no tempo da 5ª classe............”

Pois então, me lembrou um pouco a queimada e os jogos de desenhar no chão, como amarelinha, amarelinha do caco, caracol, que são conhecidos por jogos gráficos.

Alguns antropólogos acreditam que os desenhos gráficos dessas brincadeiras reproduzem estruturas de templos e que as brincadeiras são originadas de atividades adivinhatórias...

Eu adoro essa hipótese (hipótese não é uma ideia pela qual a gente se apega de algum jeito?), mas me lembrei de um professor dizendo que em 3015, os antropólogos vão achar um vaso sanitário e identificá-lo como parte de um templo onde uma tribo ritualizava depositando oferendas aos deuses...

É clássica a disputa entre filósofos e antropólogos...psicólogos e sociólogos...mas quem falou que a gente tem de escolher?
_Cibbele_

quarta-feira, 1 de abril de 2009

O Boi Brasileiro


Hoje acordei pensando no Boi Brasileiro. Também chamado de Bumba-meu-boi, Boi Bumbá, Boi de Janeiro, Boi de Mamão, Boi dá Licença e tantos outros nomes que desconheço mas que serão facilmente encontrados nos interiores da nossa terra-continente. Deu tanto banzo que fui correndo ao "iutube" só pra rever um pouquinho. Achei um monte de coisa e acabei me entregando ao deleite dessas visões verde-amarelas a manhã inteira.


O impressionante da folia do Boi é sua capacidade infinitamente Lúdica. O Boi Brasileiro é Boi-de-brincar. Porque mistura ingredientes da Cultura Lúdica (canções, histórias, danças, passos, teatralidade) com uma certa dose de "medo-de-mentirinha", "suspense-sob-medida", "acontece-mas-não-acontece". Perfeito pra brincar e perder a hora. Brincadeira sem idade, sem espaço, sem tempo. Purinha, purinha. Como essa, a Cultura Popular brasileira é cheia, mas essa é a minha preferida.

Se a gente resolve desatar a meada e seguir o longo fio do Boi, vai descobrindo o quanto é tudo entrelaçado culturalmente. A história de base é a do vaqueiro Mateus e de sua mulher Caterina, ela grávida de 8 meses com um desejo avassalador de comer a língua do boi preferido do patrão dele. A partir daí, do drama armado e seus desdobramentos, vêm as canções, as danças,a trama complexa da encenação popular que faz as crianças saltarem de lado, os adultos darem gargalhadas, as mocinhas baterem palmas, os mais velhos encherem os olhos de lágrimas. Como convém a um bom folguedo.


Tudo de uma beleza que só mesmo a Cultura Popular pode oferecer, ao módico preço do "de graça", na rua, aberta, escancarada, pra quem quiser. Brincadeira/Cultura indiscriminada.



Em tempo: ano passado escrevi um projeto pra uma Escola Materna aqui na região de Milão, que era contar a história original do boi e depois fazer um desfile por toda a escola. Pra isso, construimos bonecos de Mateus e Caterina e um boi imenso, com materiais recuperados. Não pude realizar a atividade, mas as amigas Nina Guimarães e Jacyara Farias, uma paulista a outra alagoana, o fizeram com muito garbo. Não tenho fotos, só um vídeo feito por uma outra brasileira, a fotógrafa Vivian Scaggiante, que não sei como carregar aqui. Mas pelas carinhas das crianças italianas nesse vídeo dá pra ver muito bem o impacto dessa festa aqui do outro lado do oceano.
_Claudia Souza_
 
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