sexta-feira, 18 de março de 2011

Pertencer a um povo

Ontem foi feriado nacional aqui. Era a comemoração dos 150 anos da unificação da Itália.

Quando cheguei e soube que a Itália era uma nação há só 145 anos levei um susto! Parecia um país eterno. Mas há 150 anos atrás eram vários reinos independentes, vizinhos mas praticamente incomunicáveis culturalmente. Herança das “cidades-estado” de um tempo. Foi Giuseppe Garabaldi, o mesmo que circulou pelo Rio Grande do Sul e casou com a brasileira Anita, junto com outros nomes importantes, a defender e batalhar pela unificação do país.

A (historicamente) recente unificação explica um pouco as enormes diferenças culturais entre uma cidade e outra, às vezes até bem próximas (cada uma com seu dialeto, com seus pratos típicos e seus costumes muito particulares) e a tentativa constante de construir uma identidade do povo italiano. A Itália é uma colcha de retalhos.

A própria língua italiana é o resultado de uma união um tanto quanto “forçada”. É uma língua extremamente lógica, baseada principalmente na forma falada, é muito mais “alfabética” que o português por exemplo. Foi praticamente inventada (a partir do fiorentino de Dante e Petrarca) pra ser a língua da coletividade. Por isso, pra gente que está acostumada com as vicissitudes da língua de Camões, é café pequeno (mesmo se a gente sofre um pouco no início com algumas pronúncias estranhas ao português).

Tudo isso me faz pensar no contexto cultural que uma criança italiana encontra ao nascer. O Brasil, por exemplo, é um país muito diverso, formado também de muitos povos, mas nós encontramos um modo de lidar com a diversidade que inclui e “abrasileiriza” todo mundo. Talvez porque o “alvo” de todos esses povos tenha sido o mesmo, a terra brasileira, e daí a vontade de pertencer àquela terra tenha falado mais alto. Os italianos, por sua vez, já estavam em suas terras e sua missão era outra, mais difícil talvez, a de aprender (a força) a ser povo, junto com certos vizinhos muitas vezes incômodos.

A sociedade italiana tem pego a estrada da exclusão pra se afirmar como pertencente a uma nação. Pro italiano médio existe “o italiano d.o.c.” e “o resto do mundo”. O resto do mundo cada vez mais ameaça o italiano d.o.c., porque as taxas de imigração crescem a cada dia. Milão já é uma cidade multi-étnica, como Nova York. Mas os italianos d.o.c. não admitem se integrar e muito menos “ceder” aos “extra-comunitários” o seu quinhão de identidade de cidadão italiano. As crianças são influenciadas pelas famílias a evitar e temer o “desconhecido”. Na melhor das hipóteses, a considerar o que vem de fora como “exótico”.

A coisa boa é que tem uma crescente parcela da população italiana pelejando em sentido contrário. A cada dia crescem as associações e outras instituições a favor do imigrante e da construção de uma nação múltipla, combatendo o europocentrismo, aquela noçãozinha esquisita de que o europeu é o VIP mundial. Grande parte desses grupos direcionam suas ações justamente às crianças, tentando utilizar seu natural poder de integração como fator de ampliação para os demais grupos sociais. Ou seja, partindo de ações educativas, pretende-se chegar a realidades sociais mais justas.

_Claudia_

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