- Logo que cheguei aqui em Milão, participei de um ensaio fotográfico chamado "A Memória dos Jogos Tradicionais". Duas fotógrafas, uma venezuelana e a outra italiana, queriam imagens de brincadeiras do mundo todo. As brincantes éramos eu (representando América), uma chinesa (Ásia), uma romena (Europa) e uma camaronense (África). Ajudadas pela língua (embora incipiente) em comum, a gente conversava muito durante as sessões de fotos, realizadas em várias escolas da cidade. E acabamos concluindo que a base das brincadeiras era a mesma: mudava o nome, claro, e algumas regras acessórias. As crianças italianas não tinham dificuldade nenhuma em entrar no ritmo das propostas, mesmo se a mediação não fosse necessariamente a língua (todas nós brincantes éramos recém-chegadas e, como não dominavamos bem o italiano, usávamos outros recursos de comunicação), mesmo porque não tinha muita novidade pra elas. Rapidamente identificavam a brincadeira dentro de seu repertório pessoal e cultural.
- Em setembro de 2008, em Verona, aconteceu o Tocatì, Festival Internacional de Brincadeiras de Rua, promovido pela Prefeitura da cidade em parceria com a Associação de Brincadeiras Antigas. Cada ano, a organização do Festival convida um país diferente como destaque. Desta vez tinha sido a Escócia. Pude acompanhar mesas redondas, palestras, conferências, comprar livros e catálogos sobre brincadeiras, e o mais incrível foi vê-las brincadas na rua, por adultos e crianças indistintamente. A cidade foi toda transformada num grande quintal, com pistas de bolinha de gude, tatames, chão de pião, balanços, etc. De todas as brincadeiras que vi, duas merecem destaque: uma é o arremesso de queijo, brincadeira tradicional italiana.Um queijo imenso é enrolado numa corda e depois lançado. Pra vocês nao dizerem que estou mentindo, tenho a foto abaixo pra comprovar. Outra é uma brincadeira de homens escoceses. Parece um Rugby: do alto alguém atira uma bolinha, do tamanho de uma bolinha de tênis, e os jogadores, divididos em duas equipes, se jogam uns sobre os outros na tentativa de pegá-la e levá-la à base do adversário pra fazer uma espécie de gol. Era divertidíssimo assistir, porque os jogadores podem blefar, podem esconder a bolinha dentro da roupa, podem usar as estratégias mais impensáveis. Ou seja, apesar da semelhança, nada muito esportivo, tudo muito lúdico. O impressionante é que, mesmo na confusão generalizada de gente amontoada, ninguém se machuca. Existe um respeito completo pela incolumidade física. Tinha inclusive gente de óculos!!
É fato: as crianças têm uma Cultura que avança sobre as fronteiras virtualmente construídas pra separar os Homens e pra sustentar seus poderes (igualmente virtuais). Que avança inclusive sobre o Tempo. Não existe mesmo idade pra Infância.
"Os homens não param de brincar porque envelhecem; eles envelhecem porque param de brincar" - Ditado mexicano.
_ Claudia Souza_
3 comentários:
Nossa, esse festival Tocatì deve ser muito interessante!
E' sim! Em setembro desse ano tem mais :-))) Eu tenho muitas fotos, se voce se interessar é so' me dizer.
Eu quero ver essas fotos sócia...aliás, assim que o caçula tiver maiorzinho, com certeza vou querer ver algumas belezuras como essa com vc...
: )
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