segunda-feira, 30 de março de 2009

Crescendo


Um dos efeitos da visão nostálgica da infância é a ideia de que ela é a melhor época da vida, decorrendo daí uma dificuldade em identificar o crescimento como algo positivo. Se por um lado assistimos ainda à visão da criança como mini-adultos, por outro não podemos negar uma crescente dificuldade de nossa sociedade em permitir e incentivar que cada indivíduo cresça e exerça a sua autonomia.

Dado esse parágrafo como ressalva, não posso deixar de rir de algumas representações críticas dos adultos, presentes nas produção cultural destinada às crianças:

_Ora os adultos! Exclamou Narizinho com ar de pouco caso._Não há maior sem-gracismo do que ser adulto. Bem razão tinha Peter Pan em não querer nunca virar gente grande_ ou “adulto”, como eles dizem com pedantismo. A tal gente grande não sabe fazer a única coisa interessante que há na vida...
_Que é Narizinho?
_Ora que é! Brincar, bobo. Tirando o brinquedo, que é que resta na vida. As gentes grandes arrumam a casa, varrem, lavam roupa, guiam bondes nas ruas, entregam pão nas portas, constroem navios, escrevem livros, jogam no bicho, guerreiam _ fazem tudo, menos a grande coisa que é brincar, brincar, brincar até arrebentar, como nós...
_É verdade_ concordou o menino._ Mas por que será que os adultos não brincam?
_ De medo de parecerem crianças. Eles morrem de medo de parecerem crianças, como se não fosse dez vezes mais importante ser criança do que ser uns homões de bigodes feito taturanas debaixo do nariz, ou umas mulheronas gordas, cheias de rugas na cara, sardas e pés de galinha.
_É como eu penso_ volveu Emília lá na garupa_ Se em vez de boneca eu tivesse nascido gente grande, sabem o que eu fazia? Suicidava-me com um tiro de canhão na orelha.
(Viagem ao céu - Monteiro Lobato)

E por falar em nascer gente grande, assistiram ao filme O Curioso Caso de Benjamin Button?

_Cibbele Carvalho_

13 comentários:

Claudia Souza disse...

Até o titulo do post CRESCEU... :-D
Crescer é otimo principalmente quando a gente consegue re-significar a brincadeira.

Cibele disse...

É mesmo, a gente tinha combinado de deixar em caixa baixa! hahahaha...

Vou lá corrigir...

Eu tb a-do-ro ser adulta, assim como adorei ser criança até que "deu pra mim"! hahahaha

Claudia Souza disse...

Corrige nao! Esse titulo assim tem tudo a ver com o post.

Chris Sampaio disse...

Meninas,
desde que li este post da Cil ..(que adorei!) ...estou intrigada pensando...sobre adultos infantilizados e crianças precocemente maduras...tá repleto de exemplos por aí...
talvez seja por isso que a Emília atual esbraveje tanto sobre o brincar..
será um grito das crianças ou da roteirista adulta??rsrsrsrsrs
estranho essa inversão de papéis né..!?
cuidar do canto da gente (além de crescer) também é tão bom...e a Emília falou de um jeito..sei não heim..
bjs
chris

Claudia Souza disse...

Oi, Chris. Outro dia, numa palestra, um senhor de 70 anos chamado Roberto Denti disse que esta assustado, porque ve na sociedade atual uma "longa adolescencia". E' como se a adolecencia tivesse ocupado o lugar da infancia e da maturidade que nunca chega. Acho que è por ai.

Chris Sampaio disse...

eu também Claudia, acho que é por aí..
nesse programa que eu trabalho, é interessante como alguns educadores temem em apresentar às crianças as histórias - sim, são tristes algumas das histórias das crianças da revista Globen..- com a intenção de "preservá-las"...talvez adiando o amadurecimento, talvez inviabilizando o crescimento de cidadãos...como se elas já não fossem bombardeadas pela mídia todos os dias com tragédias das mais diversas.
porém, o diverso aqui é que são histórias de pessoas de coragem, pessoas que travam batalhas diárias porque ainda acreditam na transformação e num outro mundo possível..
de qualquer forma, pelo que eu ando lendo da Pedagogia Waldorf acho que este debate deve ser mesmo levado aos adolescentes..e as crianças serem presenteadas com o belo..como os antroposóficos proclamam.
bjs
chris

Cibele disse...

Chris,
Esse texto do Lobato só faz sentido na boca das crianças (ainda que personagens),né? e de preferência na boca de crianças cercadas por adultos que amparem o crescimento no tempo que lhe é próprio. Por outro lado, se lido para crianças, soa como uma expressão de um sentimento comum na infância e se lido pelo adulto, em leitura compartilhada, serve pra lembrar como se sentem as crianças e de certa forma, dar-lhes mais ouvidos, mas não exatemente pra compactuar com esse peterpanismo (hahahaha, inventei).
O triste é ver adultos que acreditam mesmo que crescer é ruim. Não digo nem que seja indolor ou fácil, ao contrário, é dolorido e perigoso (Grande Guima) mas também é bonito demais, né?

Claudia Souza disse...

Chris, eu acho bobagem essa coisa de "preservar" as crianças. Acho que todas são filósofas e muito cedo se colocam questões muito mais sérias que imaginamos. Acho tb que o melhor presente que se possa dar a uma criança não é o belo, é a verdade mais simples. Sem dramas, só verdadeira como é, sem muita construção adulta em volta.

Cibele disse...

Clau e Chris, eu acho que não existe belo sem verdade. Mesmo que seja a verdade de que as crianças dão conta.
Chris, uma mãe de um aluno meu de teatro, que estudava em escola antroposófica, certa vez me questionou pela presença dos personages "do mau" nas histórias das crianças. Parece que na antroposofia esses personagens só aparecem depois de 3 anos...Eu acho bobagem, até porque as crianças bem pequenas tem de lidar com seus próprios sentimentos negativos. A raiva, a frustração...

Claudia Souza disse...

Ci, o pior é que existe! E é em nome de um suposto belo que se pretende criar um mundo "dourado" pras crianças, como se a verdade (ser humano, ser imperfeito, ter medo, raiva, etc) fosse feia. Esse exemplo que você deu dos contos de fadas é um pedacinho dessa concepção.

Chris Sampaio disse...

Ei Ci e Claudia,
esses retornos de vcs me fizeram lembrar de um livro, que comprei antes mesmo do Cairu nascer chamado 'O Direito à Verdade - cartas para uma criança', do pai e pediatra Leonardo Posternak.
bjs carinhosos
chris

Claudia Souza disse...

Pois é, Chris, acho que do jeito que as coisas vão,é importante rever mesmo os direitos das crianças, acrescentando àqueles básicos outros como esse, à Verdade, à Privacidade, à Autonomia... Vou procurar esse livro, parece muito interessante. Obrigada! E continue contando a muitas crianças as BELAS histórias VERDADEIRAS de outras crianças. Muitos beijos pra vc tb.

QUINTEIRAS disse...

Não conheço esse livro também não...

Clau,
Essa "beleza" asséptica é feiúra pura!

 
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