(Deixo vocês com uma série de 3 posts que havia escrito antes, enquanto trabalho meu luto. Abraços. Claudia)
Mudar de país traz muitas consequências e sobre isso tudo já foi falado. Afinal, milhões de pessoas migram todo ano, e pelo menos metade delas ou abre um blog, ou escreve um livro, ou publica artigos tentando elaborar essa experiência através de palavras ou, por que não, comunicá-la um pouco. Ou seja, nunca pensei em escrever sobre essa experiência por isso, porque não resta nada a dizer (embora eu saiba que cada um a vive na primeira pessoa do singular, é impossível ser original no assunto).
Mas pouco tempo atrás descobri uma coisa que, provavelmente, vejam bem, pro-va-vel-men-te ninguém ainda escreveu sobre. Foi um insight. Vi que, ao imigrar, é como se minha inteligência tivesse andado ao revés na linha do desenvolvimento cognitivo. E depois retomado seu curso partindo dos níveis mais primitivos.
O fato de ter conseguido ver isso já significa ter ultrapassado diversas etapas. Mas acompanhem um pouquinho o processo pra perceber como a coisa é forte. Como penso as teias da razão a partir da construção do jogo em Piaget, vou seguir esse percurso.
Imagem: M.C. Escher, Drawing Hands
1) Nos primeiros meses, eu tinha basicamente dificuldades práticas. Tive de reaprender a lidar com torneiras, vasilhas, zíperes, fechaduras, móveis, roupas e acessórios, comida, placas de trânsito, até o teclado do computador. Parece absurdo, mas é tudo diferente aqui. A gente nem percebe porque faz essas coisas mecanicamente, mas quando muda o padrão… eis a gente de novo na tentativa-e-erro, na coisa mais empírica do mundo, na total falta de destreza e de habilidade. Que podem levar ao desespero, ou aos risos como acontecia comigo. Hoje percebo que eram risos de desconcerto, mas melhor assim. O fato é que a gente parece – aos olhos dos outros e aos meus (super críticos) o Bobo da Corte. Cai a pose. Cai o orgulho de quem você é (ou foi). Cai a independência, a autonomia que você conquistou. Você tem de se reconstruir, de se re-apresentar nas ações mais elementares, mais miúdas. Qualquer semelhança com o jogo de exercício (Piaget) NÃO é mera coincidência. A gente opta pela repetição, pelo “treinamento do Arqueiro Zen”, mas mesmo assim a peleja é grande. Inteligente, eu? =S Se não consigo abrir uma persiana, fechar o zíper do casaco longo rapidinho quando preciso sair correndo pra almoçar, usar a maquininha de comprar lanche, me vestir como se deve (minhas primeiras roupas de inverno eram estranhíssimas, duas medidas acima da minha!). Operatividade? Onde? E além de tudo não sei me expressar linguisticamente pra comunicar tudo isso a quem poderia me ajudar. Sou um desastre… Com o tempo ( e paciência!) as ações vão sendo combinadas e um dia… tcharam! Consigo finalmente não ser a última do trabalho a sair pro almoço ou… não pisar no cachecol. Meus olhos ainda são ingênuos, mas acabou-se a perplexidade.Pelo menos as ações práticas já começam a estar garantidas...
CONTINUA… no próximo post!
_Claudia_
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